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sexta-feira, 17 de junho de 2011

POR ONDE COMEÇAR A MUDANÇA NA ECONOMIA


Para a economia mundial no cenário que sucede à grande crise deflagrada em 2008, ainda insolúvel para muitos países, tem prevalecido uma verdadeira revolução. O Estado teve o seu papel revisto para fazer frente aos enormes desafios e as políticas macroeconômicas, fiscal, monetária e cambial, que têm sido revistas para combater os efeitos da crise, a corrigir as distorções e buscar retomar o crescimento.
Portanto, diante de tanta mudança no quadro mundial é um equívoco considerar que não há o que ser mudado na política econômica brasileira. No que se refere às taxas básicas de juros, por exemplo, as explicações convencionais sobre as causas do seu elevado nível são, cada vez mais, insustentáveis. A economia brasileira apresenta indicadores de déficit público e dívida pública, proporcionalmente ao Produto Interno Bruto, muito melhores do que a maioria dos países. Além disso, o fato de sermos classificados como Investment Grade pelas principais agências internacionais de classificação de risco, deveria ser mais um fator diferencial.
Tomando-se as taxas de juros praticadas há uma boa ilustração da distorção. Enquanto o Brasil oferece juros de 12,0% ao ano para títulos de dez anos, outros países com fundamentos macroeconômicos muito piores praticam juros bem mais baixos: Irlanda 10,8%, Portugal, 9,8%, Espanha 5,2% e Itália 4,6%, e enfrentam graves problemas de solvência. O caso mais flagrante é o da Grécia, com 15,9%, apenas poucos pontos acima da taxa brasileira, apesar da sua situação crítica.
Outra disparidade evidente está na falta de diferenciação no Brasil entre os juros de longo, médio e curto prazos. Enquanto na maioria dos países as aplicações de curtíssimo prazo são remuneradas a taxas nominais muito baixas, próximas de zero, a economia brasileira mantém uma estrutura de remuneração que oferece uma trindade pouco provável nos mercados: segurança, liquidez e rentabilidade.
Para além da alegada necessidade genérica de “corte nos gastos públicos”, que virou uma panacéia, o Brasil tem uma vasta agenda de assunto a evoluir visando corrigir as distorções:

1) criar uma estrutura de mercado que diferencie os juros títulos dos longo, médio e curto prazos;

2) avançar no processo de desindexação de contratos e tarifas públicas, para diminuir a rigidez e a inércia da inflação;

3) aprimorar o sistema de metas de inflação, tornando-o mais flexível em termos de prazo e indicadores a serem considerados;

4) ampliar a captação de expectativas do mercado e o diálogo com os agentes, hoje excessivamente restritos ao mercado financeiro.

Sob o ponto de vista das metas de inflação em si, no sistema brasileiro, há aspectos que lhe dão um relativo grau de flexibilidade, como a tolerância de 2 pontos percentuais para cima ou para baixo do centro definido. Esta margem serviria justamente para acomodar distorções. Ocorre que nos momentos em que a inflação acumulada começa a se aproximar do teto, como há alguns meses, observa-se uma certa histeria nos mercados. Ainda mais se a política monetária ousar adotar alternativas, como as chamadas medidas macroprudenciais, adotadas com coerência nos últimos meses.
A questão é o tratamento a ser dado aos choques de oferta, quando preços de commodities, por exemplo, que são formados no mercado internacional, baseados não apenas na demanda física, mas também na especulação dos mercados futuros, especialmente na fase atual, de juros baixos nos países mais ricos.
Estes choques de oferta acabam tendo que ser combatidos no Brasil com medidas típicas de inflação de demanda. Este processo provoca distorções, pois desestimula o nível de atividades e de investimentos produtivos, além de encarecer fortemente o custo de financiamento da dívida pública e fomentar a valorização do real.
É muito importante que o Banco Central tenha autonomia operacional. Mas, a autonomia necessária não se restringe exclusivamente aos Poderes da República. Urge criar as condições para torná-lo menos refém das visões excessivamente de curto prazo do mercado financeiro. Embora elas devam fazer parte do leque de fontes a serem consideradas, não devem se constituir no “monopólio das expectativas” observado no nosso caso.

Daniela Martinelli

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